A puta da subjectividade

O início de Electric Babyland/ Lullabies remonta a 1999, ano em que a editora holandesa Meeuw Musak editou as três peças que compõem Lullabies num sete polegadas. Mais recentemente, e na sequência do interesse demonstrado pela Tomlab, Rafael Toral foi desenvolvendo um outro conjunto de composições com o intuito de criar juntamente com Lullabies um contexto alargado que permitisse a edição de um longa duração, o que aconteceu este ano. A estas Toral intitulou-as de Electric Babyland, e resultam de experiências que o músico lisboeta vinha apresentando ao vivo desde o ano passado. Embora em última análise a coerência deste lançamento não seja posta em causa, são claramente audíveis os dois trabalhos distintos no conjunto do álbum, pelo que não faz muito sentido abordar um enquanto complemento formal do outro, mas mais enquanto duas inspiradas experiências sobre os mesmos pressupostos.

Toral, numa entrevista mais ou menos recente, assumia a sua música como ambiental – não no sentido estilístico mas enquanto algo que “acomodava diferentes níveis de atenção”. Electric Babyland é paradigmático deste ponto de vista. O ouvinte facilmente se demite da audição consciente mas a abstracção total é uma impossibilidade perante a natureza desafiante de Electric Babyland, construída a partir de sons criados com uma caixa de música e um sistema modular analógico, que se perpetuam no espaço, para lá da racionalidade.

Por seu lado, Lullabies corresponde na perfeição ao nome. Três composições de uma delicadeza etérea, centrada na ressonância, sem tantas camadas sonoras mas mesmo assim longe de qualquer interpretação linear. Lullabies deturpa a noção do tempo, terminando da forma mais apropriada, num longo drone que no sete polegadas se prolonga ad infinitum.

Electric Babyland / Lullabies envolve o ouvinte numa dormência serena, embalado pela extrema sensibilidade de Rafael Toral, no que se traduz numa experiência verdadeiramente memorável, a repetir todas as noites.
Manuel Poças